Os olhos estalam-me e piscam prequelitantemente
Numa abuia ao revolucionário objecto ocular.
Aquele que nada novo me faz ver
e do velho só mostra as entranhas, revolvidas e putrefactas
que cavalgante e loucamente impulsionam e propulsam o sangue.
O visceroso, fervoroso e mucoso líquido escarlate.
O sangue de toda a besta humana,
de toda a paixão, guerra, vingança e matança preguiçosa,
o sangue da seringa que te viola toda a inocência e toda a pureza em cada poro
O sangue que te ebule e te mata a consciência.
O pulsar jusante de vida que impulsiona esse vómito e esse nojo para toda esta panóplia grotesca de sensações abjectas.
Sim, a futilidade do eu, do tu e do vós.
Ah, tanta alta metafísica e elaborada religiosidade,
Tanta tecnocracia e industrialidade.
"Tudo existe porque tudo provamos,
tudo provamos porque o tudo queremos,
o tudo é tudo porque sempre fui e há de ser tudo,
e somos tudo porque criamos o tudo"
Escorre-vos medo pelas cavidades,
Medo de que toda a bela criação, evolução, progressão e deificação se suma num suspiro,
Medo que se dissolva num vórtice de entropia tomando por mero absurdismo entretinente toda a vossa acção deliberada no propósito abissal.
Que se arraste sem que vos arraste a vós para o abismo da verdade e vontade metamorfa,
que tão bem se engana como engana a vós na sua indubitavelmente dúbia inexistência.
E acordas, ofegante, suado, delirante.
Afogas-te na tua loucura porque a desejaste.
Desde a precária e desmesurada génese teotécnica que ardes
Ardes no desejo, no amor e na paixão,
Ardes na blasfema tentação de te tentares pela blasfémia,
Ardes por arder na monumentalidade da pira noctívaga.
Combustas nas tuas reles e macabras dúvidas
e voltas a drogar a máquina.
A máquina das rodas dentadas que te mastigam ruminam e regurgitam,
Dos êmbolos que te violam, cíclica e pendularmente com o bater e respirar maquinal de uma fera sedenta e raivosa.
A máquina dos intermináveis indetermináveis erros de seriação e provocação.
Os magistrais e ancestrais eixos da universalidade sustentada,
Os que erguem bem alto a cortina intoxicante e dolorosa,
A do toque acetinado que te acaricia intolerantemente com toda a angústia e sofrimento,
A decoração prostrada e luxuriosa que te consome de inveja e possessão.
E mais que tudo, o delírio desvairantemente desvariado da curiosidade sufocante.
Escorres sedimentado para o abismo conforme a verdade se desintegra aos teus olhos e absolves-te no vazio.
No frio e escuro vazio necrófago.
Num fôlego, vês a carnivalesca versão do mundo:
O desfile das utopias canibais,
Os carros alegóricos a radiar a euforia cósmica,
E a forja das vaidades teatrais
Onde, lenta e dolorosamente, se derretem as máscaras e identidades.
O ar expirou, numa nuvem vaporizada e espiralesca,
dissipando-se no cosmos, tão disperso e acolhedor, o cosmos.
Espairas asas como a fénix e sobrevoas o abismo,
consagras-te sob a catarata do aço líquido
e projectas-te inconscientemente no infinito.
Numa acreção mórbida vês-te rodeado de toda a vermalhada podre.
Desintegras-te em matéria excreta e adubante e dissipas-te.
Dissipas-te num ciclo sumptuoso, tortuoso, e ironicamente voluptuoso do último fôlego
O do nada, tão profundo e absoluto, que de trevas te ilumina.
Do nada que te engole, na garganta funda e sórdida,
tão abismalmente asquerosa,
tão delirantemente esclarecida.
E que num vómito convulso de nojo te eterniza nessa eternidade inexistente
E de repente és a criança afortunada e ingénua outra vez,
a descer o escorrega vortiçal até ao nirvana.
És nada, não és, não foste.