domingo, 14 de março de 2010

Se algum dia apareceres, foge para longe, Se existires, tenta morrer ou esquecer. Se te procurarem, não te dês, Se procurares alguém, pára. É Inútil. Quando vires nojo, ódio e podridão à tua volta,
não estranhes, é sinal que as coisas estão como devem. Ninguém gosta de ti nem de ninguém, Deus abandonou-te e abandonou-se, desistiu de existir. Não há nada senão este lugar ermo e podre e outros lugares ermos e podres. Tens medo, muito medo, avisaram-te que ia ser assim, Mas nunca percebeste. Agora percebes. Percebes o que é ver a tua alma despedaçar-se como lepra em frente a um espelho, Percebes o que é pavoneares-te na rua como carne num talho, à espera de ser fatiada e devorada. Agarraste àquilo que tens, à vontade de te agarrares a alguma coisa. És, ou pelo menos foste, demasiado pura para estar neste mundo. Já não és, Já te devoraram, Já te violaram, és mais um produto dessa qualquer coisa rastejante, mucosa e regurgitada. Desculpa.

quarta-feira, 3 de março de 2010

A ratazana

Um grito ou um urro qualquer gutural ressoa, húmido, nojento e asqueroso, como que vindo dum cano de esgoto, ritmado pelo bater das pingas e o ruído das ratazanas, esses bichos curiosos, filhos do infortúnio, que nada fizeram senão dar-se gratas por ter tudo do que é reles, nojento, putrefacto e comestível. E nesses guinchos de ódio milenar ganham o fervor e a vontade de vingar já nem sabem o quê. Não querem saber, não devem saber, não podem saber. Não podem saber que são a praga, para que possam ser a praga. Têm de marchar, como hostes enfurecidas e desvairadas de canibalismo amontoado da mais nojenta perversão e atacar. Atacar, consumir, regurgitar, defecar, infectar e violar tudo quanto lhes apareça pela frente.

No subsolo, na base e na cave escura de uma qualquer coisa funcional vive sempre uma outra coisa desenfreadamente disfuncional e irracional, que se alimenta de tudo quanto é despejado, recalcado e excretado pelos outros, os outros belos, os outros sublimes, os outros que de nada escumalha têm, pois deitam a essa escumalha que repisam toda a sua escumalhisse bruta e deslavada. E por baixo dessa escumalha, há uma outra escumalha mais escumalhosa, e por debaixo dessa, uma outra, e assim por diante. Essa bela humanidade há de ser consumida pelos abutres da sua própria natureza, e os abutres pelos ratos, os ratos pelos vermes, os vermes por mais vermes, e esses por fungos e demais coisas macabras e nojentas. A beleza e a funcionalidade organizacional sustentam-se no equilíbrio, mas os demais que que equilibram a pirâmide no seu vértice hão de tombar, e tudo se desmoronará, deixando nada mas a ralé e a escumalha de sobra, a que vive das sombras, da ruína e do cadáver.